20 janeiro 2012

Astronauta



Conta-se que uma vez, um astronauta foi enviado numa 
missão de muitos anos em órbita da Terra em uma 
espaçonave que tinha um habitat um pouco maior do que
seu próprio corpo.
De início, ficou extremamente apreensivo pois não sabia o que 
esperar de tal missão, por ser sua primeira, e apesar de ter sido 
treinado em Terra por muitos anos.
Tinha todo o conhecimento técnico, mas o que o fascinava e 
ao mesmo tempo amedrontava era o vazio de não conseguir 
precisar ou esperar os seus próprios limites pela falta da 
vivência nessa nova experiência.
Mergulhou nela, no seu fascínio, e por muito tempo contentou -se
experienciando a imensa beleza, perfeição e constância de sua nova vida, 
como se tivesse sido abençoado por poder por em prática todas as rotinas
 que havia aprendido, congratulando-se pelo seu perfeito desempenho, 
como se tudo corresse como desejava.
Até que um dia, extasiado com a maravilhosa vista dos inúmeros nasceres 
pores de sol que via num único dia terrestre, ouviu, pela primeira vez, 
vindo dos fundos dos fundos das engrenagens de sua nave um ruído
 que destoava imensamente de toda aquela paz que tinha estado 
mergulhado por tanto tempo. 
Nem alto, nem baixo, mas firme e constante.
Aquilo era praticamente nada diante daquela imensidão em que se 
encontrava, mas dentro de sua cápsula, só, após decorrido algum tempo,
 começou a pronunciar-se cada vez mais.
 Procurou a fonte desse ruído incansavelmente e sem sucesso, 
aquele "tic toc" que passou a fazer parte de sua vida diária, como 
uma ínfima pedra no sapato, crescia em sua consciência ameaçando 
aquilo que elegera como seu paraíso. 
Agora constrangido por essa crescente ameaça invisível em sua mente,
e consciente de que mais cedo ou mais tarde levaria-o à insanidade, 
sem perceber, deu asas às mais diversas e terríveis suposições teve
 em sua mente um florescimento de inúmeras visões e sentimentos 
que o aprisionaram em uma dolorosa vivência perturbadora. 
Durante muito tempo, fantasias criadas a partir dessas visões 
 perseguiram-no e bloquearam a sua capacidade de ver aquela 
simplicidade e perfeição tão caras anteriormente. 
Seu paraíso ruíra, já não conseguia alcançar a tão estimada paz, 
ou contemplar por muito tempo as mais belas visões que a sua
 única janela descobria-lhe constantemente, sentia um buraco
 no peito, uma melancólica saudade de algo que já não se 
lembrava. O ruído tornou-se foco e objeto de sua atenção. 
Incessantemente, refletiu e armou-se das mais astuciosas estratégias 
de combate à loucura, não podia deixar-se ser derrotado, 
mas sem sucesso, sucumbiu e entregou-se à própria sorte, 
isolado em sua ilha no espaço. 
Depois de um sono que há muito deixara de ser reconfortante, 
decidiu que não podia mais lutar contra aquilo que se lhe apresentava 
como realidade, então num gesto de quase desespero, 
fechou os olhos e quis ser livre daquilo que há tanto o aprisionava.
E ouviu, pela primeira vez com atenção e cuidado 
aquele ruído que tanto o incomodava. Ouviu, deixou-se sentir todas 
aquelas emoções e sentimentos que tinham brotado de seu coração
 por todo aquele tempo de perturbações. Ouviu e admirou-se 
da fragilidade de sua paz de espírito, da inocência do crédito 
à sua própria sorte, abaladas por tão pequena coisa, 
externa a si mesmo, incontrolável. 
Inconformado, percebeu que a única coisa que podia fazer era 
deixar-se tomar por aquele ruído, entendê-lo, aceitá-lo. E admirou-se, 
por coisa tão pequena tornar-se tão grande e importante dentro de si, 
por ter dado crédito a toda a sorte de interpretações e especulações 
provenientes de sua própria mente, por escolher aquilo dentre tantas 
coisas a escolher, por fazer daquilo objeto e objetivo de sua vida.
 Respirou profundamente e expirou aquela solidão.
 E sentiu em seu íntimo uma sensação de acolhida desconhecida até 
então. Um abraço invisível. Aconchego. Silêncio. E perdeu-se naquele 
sentimento, naquela entrega, perdeu-se no entendimento 
da sua pequenez.
Quando abriu os olhos, sentia-se em paz, como há muito
 já não se lembrava.
 E sorriu pela primeira vez em muito tempo porque pode perceber
 a sua janela mais uma vez. E em meio a esse contentamento 
não ouvia mais aquele ruído desconcertante, nem sequer lembrou-se
 mais dele. Prestou mais atenção e ouviu suaves notas sonoras que 
davam perfeito pano de fundo à sua maravilhosa visão. 
Apaixonou-se por essa sinfonia tão bela de um tilintar 
constante e firme e amou de verdade tudo o que estava 
à sua volta porque tudo fazia-o feliz. Sentiu-se livre e desejou,
 lá do alto, humildemente, do seu pequeno casulo 
que todos os que estavam na face da Terra, acima dela 
e todos aos que suas preces alcançassem, pudessem 
compartilhar com ele aquele "ó" de deslumbramento 
diante de tamanha harmonia, perfeição e simplicidade 
de tudo que os rodeia e que pudessem ter a visão da luz do sol 
a qualquer instante, assim como desejassem, como ele próprio 
podia, e terem a perspectiva e a altura suficientes para perceberem 
a curvatura da Terra, sua casa, e vislumbrarem a imensidão
das estrelas para além de seus limites, mesmo estando eles também, 
presos em seus próprios casulos espaciais.


A história é fictícia, mas as seguintes fotos e comentários são do astronauta americano Douglas Wheelock, 
tido como o astronauta poeta.

terra-azul

Lá do alto, o Lago Titicaca, entre o Peru e a Bolívia “Eu venho acompanhando a paisagem única e deslumbrante da América do Sul, e de vez em quando me encontro sem palavras para descrever tamanha beleza. Aqui vai uma foto de Peru, Bolívia e Chile com os majestosos Andes alongando a altura do continente. No centro da foto está o Lago Titicaca, na fronteira entre o Peru e a Bolívia”.

bahamas

As Ilhas Bahamas: "poucos lugares do mundo rivalizam em cores" com elas. “De todos os lugares do nosso planeta glorioso, poucos rivalizam em cores com as Bahamas. Aqui vai uma visão do nossa nave de reabastecimento Progress-37, com as Bahamas de fundo. Que mundo maravilhoso!”

nuvens-polares

A fina camada de nuvens polares ao pôr-do-sol “Essa é a estação do ano em que mais vemos nuvens polares, e com o nosso ângulo alto é possível capturar essa fina camada de nuvens no pôr-do-sol”.

lua

"Me leve até a Lua... Espero nunca deixar de estar maravilhado" “Me leve até a Lua… Deixe-me dançar entre as estrelas… Espero nunca deixar de estar maravilhado. A paixão pela exploração e pelas descobertas é um nobre legado para deixar a nossas crianças. Espero que levantemos nossas velas e nos aventuremos um dia. Esse seria um dia glorioso…”

ilha-de-oahu

Ilha de Oahu, no Havaí: "Beleza de tirar o fôlego" “Ilha de Oahu, no Estado do Havaí. Algumas nuvens, mas é possível ver com clareza a capital, Honolulu, a cratera Cabeça de Diamante e Pearl Habor. A ideia é capturar a beleza com a câmera, mas queria que minhas pestanas fossem shutters para que pudesse tuitar essas imagens. Beleza de tirar o fôlego”.

por-do-sol

"A Terra é uma explosão de vida num vasto mar de escuridão" “Outro pôr-do-sol é de tirar o fôlego… nós vemos 16 desses todo os dias na órbita terrestre, cada um é um momento especial. Essa linda linha azul é o que faz da nossa casa ser tão especial nos cosmos. O espaço é legal… mas, a Terra é uma explosão de vida num vasto mar de escuridão”.

montanhas-coastal

Montanhas Coastal, no Canadá: "O Criador ainda está trabalhando... apesar de nós" “‘Rio de Gelo’… Existem incontáveis lugares na Terra que nos lembra que o Criador ainda está trabalhando por nós… ou melhor… apesar de nós. Aqui está uma vista da deslumbrante paisagem das Montanhas Coastal, na Colúmbia Britânica, no Canadá. O gelo prateado através de uma lente de 400 milímetros”.

ilhas-gregas

O brilho de Atenas: "Ver o esplendor dessas ilhas anciãs (as Ilhas Gregas) é surreal" “As Ilhas Gregas durante uma clara noite da Europa. Atenas brilhando às margens do Mar Mediterrâneo. Ver o esplendor dessas ilhas anciãs de fora – do espaço – é um sentimento muito surreal”.

aurora-boreal

Aurora Boreal: "As luzes do Norte começam a dançar pelo céu" “Aurora Boreal. Nós temos aproveitado a beleza das luzes do Sul nas últimas semanas. Agora com o crescimento da atividade solar, enquanto o sol diminui devagar até o outono, as luzes do Norte começam a dançar pelo céu. A Terra nunca cansa de nos deixar maravilhados. Cores, movimento, vida, dias abençoados, noites sagradas”.

minha-janela

O privilégio de ver pela janela da Estação: "Minha alma canta!" “Cada vez que olho através da janela e contemplo nosso belo planeta, minha alma canta! Olho céus azuis, nuvens brancas e benditos dias brilhantes.”

costa-da-australia

A Grande Barreira de Coral, na Austrália: "Cor, movimento e vida" “O reflexo de cor, movimento e vida na tela do nosso maravilhoso mundo. Esta é parte da Grande Barreira de Coral ao largo da costa oeste da Austrália, fotografada com uma lente de 1200mm.”

italia

À noite, iluminada, "a beleza sedutora da Itália" “A beleza sedutora da Itália, uma noite clara de verão. Pode-se ver numerosas ilhas que adornam a costa – Capri, Sicília e Malta. Nápoles e o Monte Vesúvio se localizam ao largo da costa.”

patagonia

A Patagônia, no sul da Argentina: "Perfeita harmonia" “No sul da América do Sul se encontra a pérola da Patagônia. A impressionante beleza de montanhas rochosas, massivos glaciais, fiordes e oceanos se combinam em perfeita harmonia.”

astronauta

Na escuridão, a luminosidade vem do capacete “A uma velocidade de 28,163 km/h (8 quilômetros por segundo) rodamos a órbita terrestre, fazendo uma evolução a cada 90 minutos, e encontrando-nos com um nascer e um pôr-do-sol a cada 45 minutos. Assim que a metade de nossa jornada é durante a escuridão, e para isso dispomos de luzes em nossos capacetes.”











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