Conta-se que uma vez, um astronauta foi enviado numa
missão de muitos anos em órbita da Terra em uma
espaçonave que tinha um habitat um pouco maior do que
seu próprio corpo.
De início, ficou extremamente apreensivo pois não sabia o que
esperar de tal missão, por ser sua primeira, e apesar de ter sido
treinado em Terra por muitos anos.
esperar de tal missão, por ser sua primeira, e apesar de ter sido
treinado em Terra por muitos anos.
Tinha todo o conhecimento técnico, mas o que o fascinava e
ao mesmo tempo amedrontava era o vazio de não conseguir
precisar ou esperar os seus próprios limites pela falta da
vivência nessa nova experiência.
vivência nessa nova experiência.
Mergulhou nela, no seu fascínio, e por muito tempo contentou -se
experienciando a imensa beleza, perfeição e constância de sua nova vida,
como se tivesse sido abençoado por poder por em prática todas as rotinas
que havia aprendido, congratulando-se pelo seu perfeito desempenho,
como se tudo corresse como desejava.
Até que um dia, extasiado com a maravilhosa vista dos inúmeros nasceres
e pores de sol que via num único dia terrestre, ouviu, pela primeira vez,
e pores de sol que via num único dia terrestre, ouviu, pela primeira vez,
vindo dos fundos dos fundos das engrenagens de sua nave um ruído
que destoava imensamente de toda aquela paz que tinha estado
mergulhado por tanto tempo.
Nem alto, nem baixo, mas firme e constante.
Aquilo era praticamente nada diante daquela imensidão em que se
encontrava, mas dentro de sua cápsula, só, após decorrido algum tempo,
começou a pronunciar-se cada vez mais.
Procurou a fonte desse ruído incansavelmente e sem sucesso,
aquele "tic toc" que passou a fazer parte de sua vida diária, como
uma ínfima pedra no sapato, crescia em sua consciência ameaçando
aquilo que elegera como seu paraíso.
aquilo que elegera como seu paraíso.
Agora constrangido por essa crescente ameaça invisível em sua mente,
e consciente de que mais cedo ou mais tarde levaria-o à insanidade,
e consciente de que mais cedo ou mais tarde levaria-o à insanidade,
sem perceber, deu asas às mais diversas e terríveis suposições e teve
em sua mente um florescimento de inúmeras visões e sentimentos
que o aprisionaram em uma dolorosa vivência perturbadora.
em sua mente um florescimento de inúmeras visões e sentimentos
que o aprisionaram em uma dolorosa vivência perturbadora.
Durante muito tempo, fantasias criadas a partir dessas visões
perseguiram-no e bloquearam a sua capacidade de ver aquela
simplicidade e perfeição tão caras anteriormente.
perseguiram-no e bloquearam a sua capacidade de ver aquela
simplicidade e perfeição tão caras anteriormente.
Seu paraíso ruíra, já não conseguia alcançar a tão estimada paz,
ou contemplar por muito tempo as mais belas visões que a sua
única janela descobria-lhe constantemente, sentia um buraco
no peito, uma melancólica saudade de algo que já não se
lembrava. O ruído tornou-se foco e objeto de sua atenção.
única janela descobria-lhe constantemente, sentia um buraco
no peito, uma melancólica saudade de algo que já não se
lembrava. O ruído tornou-se foco e objeto de sua atenção.
Incessantemente, refletiu e armou-se das mais astuciosas estratégias
de combate à loucura, não podia deixar-se ser derrotado,
mas sem sucesso, sucumbiu e entregou-se à própria sorte,
isolado em sua ilha no espaço.
mas sem sucesso, sucumbiu e entregou-se à própria sorte,
isolado em sua ilha no espaço.
Depois de um sono que há muito deixara de ser reconfortante,
decidiu que não podia mais lutar contra aquilo que se lhe apresentava
como realidade, então num gesto de quase desespero,
fechou os olhos e quis ser livre daquilo que há tanto o aprisionava.
E ouviu, pela primeira vez com atenção e cuidado
E ouviu, pela primeira vez com atenção e cuidado
aquele ruído que tanto o incomodava. Ouviu, deixou-se sentir todas
aquelas emoções e sentimentos que tinham brotado de seu coração
por todo aquele tempo de perturbações. Ouviu e admirou-se
da fragilidade de sua paz de espírito, da inocência do crédito
à sua própria sorte, abaladas por tão pequena coisa,
externa a si mesmo, incontrolável.
da fragilidade de sua paz de espírito, da inocência do crédito
à sua própria sorte, abaladas por tão pequena coisa,
externa a si mesmo, incontrolável.
Inconformado, percebeu que a única coisa que podia fazer era
deixar-se tomar por aquele ruído, entendê-lo, aceitá-lo. E admirou-se,
por coisa tão pequena tornar-se tão grande e importante dentro de si,
por ter dado crédito a toda a sorte de interpretações e especulações
provenientes de sua própria mente, por escolher aquilo dentre tantas
coisas a escolher, por fazer daquilo objeto e objetivo de sua vida.
Respirou profundamente e expirou aquela solidão.
deixar-se tomar por aquele ruído, entendê-lo, aceitá-lo. E admirou-se,
por coisa tão pequena tornar-se tão grande e importante dentro de si,
por ter dado crédito a toda a sorte de interpretações e especulações
provenientes de sua própria mente, por escolher aquilo dentre tantas
coisas a escolher, por fazer daquilo objeto e objetivo de sua vida.
Respirou profundamente e expirou aquela solidão.
E sentiu em seu íntimo uma sensação de acolhida desconhecida até
então. Um abraço invisível. Aconchego. Silêncio. E perdeu-se naquele
sentimento, naquela entrega, perdeu-se no entendimento
da sua pequenez.
então. Um abraço invisível. Aconchego. Silêncio. E perdeu-se naquele
sentimento, naquela entrega, perdeu-se no entendimento
da sua pequenez.
Quando abriu os olhos, sentia-se em paz, como há muito
já não se lembrava.
já não se lembrava.
E sorriu pela primeira vez em muito tempo porque pode perceber
a sua janela mais uma vez. E em meio a esse contentamento
não ouvia mais aquele ruído desconcertante, nem sequer lembrou-se
mais dele. Prestou mais atenção e ouviu suaves notas sonoras que
davam perfeito pano de fundo à sua maravilhosa visão.
a sua janela mais uma vez. E em meio a esse contentamento
não ouvia mais aquele ruído desconcertante, nem sequer lembrou-se
mais dele. Prestou mais atenção e ouviu suaves notas sonoras que
davam perfeito pano de fundo à sua maravilhosa visão.
Apaixonou-se por essa sinfonia tão bela de um tilintar
constante e firme e amou de verdade tudo o que estava
constante e firme e amou de verdade tudo o que estava
à sua volta porque tudo fazia-o feliz. Sentiu-se livre e desejou,
lá do alto, humildemente, do seu pequeno casulo
que todos os que estavam na face da Terra, acima dela
lá do alto, humildemente, do seu pequeno casulo
que todos os que estavam na face da Terra, acima dela
e todos aos que suas preces alcançassem, pudessem
compartilhar com ele aquele "ó" de deslumbramento
diante de tamanha harmonia, perfeição e simplicidade
de tudo que os rodeia e que pudessem ter a visão da luz do sol
a qualquer instante, assim como o desejassem, como ele próprio
podia, e terem a perspectiva e a altura suficientes para perceberem
a curvatura da Terra, sua casa, e vislumbrarem a imensidão
compartilhar com ele aquele "ó" de deslumbramento
diante de tamanha harmonia, perfeição e simplicidade
de tudo que os rodeia e que pudessem ter a visão da luz do sol
a qualquer instante, assim como o desejassem, como ele próprio
podia, e terem a perspectiva e a altura suficientes para perceberem
a curvatura da Terra, sua casa, e vislumbrarem a imensidão
das estrelas para além de seus limites, mesmo estando eles também,
presos em seus próprios casulos espaciais.
A história é fictícia, mas as seguintes fotos e comentários são do astronauta americano Douglas Wheelock,
tido como o astronauta poeta.
tido como o astronauta poeta.
Lição maravilhosa!!!!
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